APEDREJAMENTO DA
MULHER ADÚLTERA
PR.
Érico Rodolpho Bussinger
No Evangelho de João cap.8 encontramos o
caso da mulher adúltera, apanhada em flagrante. Os judeus, para terem de que acusar
Jesus, lembraram-lhe a Lei de Moisés, onde ordenava
que a mulher apanhada em flagrante adultério fosse apedrejada (Lv.20:10). E queriam saber a opinião de Jesus a
respeito. A pergunta foi maliciosa, pois
o apedrejamento de adúlteros não mais existia, por várias razões. Mas estava escrito na Lei. Caso Jesus defendesse a letra da Lei, estaria
contra os romanos. Caso fosse contra a
Lei, eles o acusariam por isso junto ao povo. A resposta de Jesus foi sábia, respaldou a Lei e devolveu a eles a
questão quanto à aplicabilidade da Lei. E essa é outra questão fundamental. Quem deve aplicar a pena capital?
Há muitos complicadores no assunto. O texto referente à mulher adúltera se encontra entre colchetes, o que significa que muitos estudiosos duvidam (nós não) que ele realmente conste do texto original. A prática de apedrejamento não era utilizada pelos romanos e os judeus não tinham autonomia para aplicá-la. Além do mais, não há na Bíblia, ao que me lembre, qualquer referência a alguma situação em que uma mulher adúltera de fato tenha sido apedrejada. O texto bíblico da Lei condenava tanto o homem como a mulher ao apedrejamento (Lv.20:10). Com o passar do tempo, os israelitas passaram a tolerar os pecados do homem a esse respeito, mas tratavam com rigor diferenciado a mulher que fazia o mesmo. Dois pesos e duas medidas, aproximadamente o que ocorre hoje ainda no islamismo. E de forma igualmente apelativa à memória, não me lembro de qualquer texto em que o próprio Deus tenha cobrado dos israelitas que praticassem esse apedrejamento. Deus cobrou que o apedrejamento fosse feito, mas por outras razões, como a blasfêmia ou idolatria (Lv.20:2, 24:14,23). Mas não cobrou o apedrejamento quanto ao adultério. E nem só da mulher. Nem mesmo de Davi com a Batseba.
Quando Deus levantou os profetas, para
denunciar o pecado do Seu povo Israel, também não me lembro de qualquer
passagem em que o Senhor cobrasse a prática do apedrejamento dos
adúlteros. Com Esdras e Neemias foi
cobrada a separação no caso dos casamentos mistos (com mulheres estrangeiras). Mas Deus não cobrou o apedrejamento dos
adúlteros. Deus falou muitas vezes,
através dos profetas, sobre o adultério.
Mas não cobrou a prática do apedrejamento.
O que podemos dizer sobre o assunto? Estaria Deus
então tolerando o adultério? Claro que não.
Todo o Antigo Testamento contém situações semelhantes, que podem nos deixar dúvidas. Aliás, uma grande parte do Antigo Testamento se refere à História do Povo de Israel, como o Gênesis, as crônicas ou mesmo registros históricos, mas sem uma análise de mérito ou mesmo julgamento. Nesses casos isso ficou para o leitor analisar. Como exemplo disso, a doença nos pés do rei Asa (1Re.15:23,24 e 2Cr.16:12). Em um texto essa doença é apenas reportada. No outro texto ela é mencionada como a causa da sua morte e teria vindo da parte de Deus como um teste para a sua fé. Em geral grande parte do Antigo Testamento carece de interpretação. Até mesmo profecias claras e objetivas da parte de Deus, denunciando o pecado, também não diziam explicitamente o que o povo deveria fazer para se consertar dele. Ficava por conta dos fiéis.
No caso do apedrejamento de adúlteros a
pena deveria ser aplicada no caso de
terem sido apanhados em
flagrante. E as testemunhas seriam as primeiras. Sem testemunhas
não se aplicaria a pena, embora o homem pudesse ter ciúmes da mulher. E aí seria outra situação (Nm.5:13,14). Neste
caso, sem flagrante, mesmo tendo adulterado, ela não morreria. Entendemos que, pelo fato de ser
necessário o flagrante, a sociedade toda
deveria estar representada no apedrejamento. Até crianças testemunhariam
essa morte violenta. Seria para chocar mesmo ! Quando o adultério fosse
constatado em flagrante, a sociedade toda deveria sofrer (o que ocorria no
apedrejamento). Caso a sociedade se omitisse (o que sempre aconteceu), estaria
sendo conivente com o pecado. E a punição de Deus seria para todo o povo e não
somente para os adúlteros. É bom lembrar que adúlteros sempre existiram e o
próprio Deus testifica isso através de seus profetas (Os.7:4). Esse é mais um exemplo de lei pedida pelos
israelitas (Dt.5:27). Mas que Deus sabia
que não seria aplicada, como de fato nunca foi.
Eu acredito até que, devido às duras conseqüências e envolvimento, o povo preferiu “fingir” que não via
adultérios. Mas era uma lei (juízo) necessária, para respaldar os “Dez
Mandamentos” (Ex.20:14): “Não adulterarás.” Mas e se adulterar? Tem que haver morte por apedrejamento.
Afinal, toda essa lei foi pedida pelo povo de Israel (Ex.19:8 e 20:19). E deveria ser cumprida por ele. Mas não foi. Por isso também se tornou necessária a graça, que veio por Jesus. Ela completaria a Lei, que veio por Moisés (Jo.1:17). E a Lei deve horrorizar mesmo, para que se busque a graça.
O apedrejamento de adúlteros é um exemplo
de como não se consegue ser justificado pela aplicação da Lei.
Nenhum comentário:
Postar um comentário